quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Primeira parte de uma breve história das revistas

Thomaz Souto Corrêa* - 02 de Agosto de 2005, 15:05

Tenho contado essa história das revistas desde 1986, em congressos, seminários, aulas no Curso Abril de Jornalismo. Como nunca me preocupei em patenteá-la, caíram-me em mãos versões apócrifas, nas quais não percebi sequer o desejo de mudar o meu estilo. Imagine então dar crédito... Vivendo e aprendendo. No futuro, terei mais cuidado, vou ouvir os conselhos da Alice, e serei menos pródigo em cópias.

Comecei a pesquisar a história das revistas porque não encontrei nenhum livro a respeito nas minhas andanças pelo mundo. Há diversos livros sobre a história das grandes revistas americanas e européias, mas nenhum contando a história das revistas, desde o início.

A mesma razão me levou a sugerir ao Roberto Civita que, em vez de comemorar os cinqüenta anos da Abril com uma grande festa, gastássemos o dinheiro para montar uma equipe e escrever o primeiro livro sobre a história das revistas no Brasil.

Para mim, não encontrar o livro sobre as revistas era como trabalhar no cinema sem saber qual tinha sido o primeiro filme. Por onde começar? Pelo Dedoc, claro. Susana Camargo e Bizuka Corrêa foram preciosas colaboradoras na pesquisa. Sem elas, eu não teria história para contar.

Esta história é uma pesquisa em aberto. Eu continuo lendo e encontrando pedaços espalhados em livros sobre revistas dos mais diferentes gêneros. Então, a que se segue é por assim dizer a versão mais atualizada. (Atenção, turma da cópia!)

O aspecto mais fascinante da história das revistas é que toda essa indústria repousa em apenas algumas poucas idéias de revistas que foram se reproduzindo ao longo do tempo, no mundo inteiro. Preciso confessar aqui que me concentrei na história das revistas ocidentais, pelas óbvias dificuldades em pesquisar as orientais.

E também porque nenhum estilo de revista oriental com a exceção dos "mangás", que eu saiba influenciou o nosso modo de fazer revista. Ah, não, há uma exceção: fazem-na os designers que põem títulos na vertical...

Vamos então a essa história de idéias de revistas. A primeira de que se tem notícia já embutia o conceito de que revista é sinônimo de variedade. O objeto era igual a um livro, mas com assuntos variados, ainda que reunidos sob um mesma tema, no caso a teologia. Enquanto os livros tratavam e geralmente tratam de um mesmo tema, a revista inovou, ao tratar de um mesmo tema com assuntos variados.

Chamava-se Edificantes Discussões Mensais a primeira revista de que temos registro. Nasceu em Hamburgo, em 1663, e era parecida com o Foreign Affairs de hoje em dia: o formato quase igual, o mesmo "jeitão": uma sucessão de artigos em branco e preto.

Corre uma história curiosa no mundo revisteiro, do gênero "se non é vero..." A revista teria sido percebida pelo leitor como se fosse uma loja, onde as pessoas entram, escolhem e compram somente o que querem consumir. Na revista, acontece a mesma coisa: o leitor entra na revista, e escolhe o que quer ler. Daí o nome magazine pelo qual as revistas são conhecidas em alguns países da Europa e nos Estados Unidos. Mas sei lá, entende?

Seja lá como for, a idéia deu certo, sem nenhuma pesquisa de mercado, e a novidade da revista monotemática foi logo copiada. Em 1665, surgiram a francesa Jornal dos Sábios, sobre ciências, e a inglesa Transações Filosóficas; em 1668, apareceu a italiana Jornal dos Literatos.

O passo seguinte foi a invenção da revista multimemática. Na França, em 1672, alguém teve a idéia de misturar assuntos muito variados, debaixo de um mesmo título, e inventou o que hoje chamamos de revista de interesse geral. O Mercúrio Galante publicava crônicas sobre a Corte, anedotas elegantes, poesia.

Mas levou vinte anos para que alguém inventasse a primeira revista feminina da história, em 1693, sempre na França. Pelo jeito, essa revista era aparentada com o Galante, porque se chamou Mercúrio das Senhoras. Também tinha a crônica da Corte e poesia, mas mostrava desenhos de roupas, moldes para vestidos e bordados, poesia.

Dando uma de engenheiro de obra feita, fica fácil dizer que, do ponto de vista do marketing, as revistas nasceram segmentadas por tema teologia, ciências, literatura , e o Mercúrio Galante inaugurou a seção de revistas segmentadas por mercado leitor, no caso o feminino.

O número de novas revistas se multiplicou pela Europa, onde o analfabetismo diminuía e o interesse por novas idéias crescia.

O aparecimento das revistas nos Estados Unidos começou com uma história de ferrenha concorrência. Era 1741, e Benjamim Franklin estava para lançar no dia 13 de fevereiro a primeira revista do novo continente, chamada General Magazine and Historical Chronicle. Mas Ben tinha um concorrente nos negócios, que já ouvira falar da novidade. E foi assim que Andrew Bradford lançou o American Magazine, or Monthly View, três dias antes!

A briga sobre quem tinha sido o primeiro foi curta, porque a revista de Bradford durou três meses, e a de Franklin seis. Interessante notar que ambas as revistas tinham dois títulos, separados por or ou por and, e esse costume acompanhou as revistas americanas durante muito tempo.

Aliás, as brasileiras também começaram com a mesma dúvida sobre quem teria sido a primeira. Em 1808 saiu o Correio Brazilense ou Armazém Literário (perceberam o ou?). Quatro anos depois surgiu As Variedades ou Ensaios de Literatura (olha ele aí de novo...) . Como ambos tinham aparência de livro, o Correio passou a ser o primeiro jornal, porque alguns historiadores acharam que Variedades obedecia mais a um espírito editorial de revista (seja lá o que isso for), e ela virou oficialmente a número um da categoria. Tanto que a consideramos como tal no nosso livro A Revista no Brasil.

No próximo capítulo, falaremos sobre como nasceu o negócio revistas. E sobre idéias que fizeram, e fazem, história. Thomaz Souto Corrêa é membro do Conselho de Administração, VP do Conselho Editorial e Consultor para Revistas do Grupo Abril

* é membro do Conselho de Administração, VP do Conselho Editorial e Consultor para Revistas do Grupo Abril.

O texto acima foi extraído de uma matéria da Equipe da Editora Abril, postado neste blog por Marcello Dantas.

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